segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Bendita a Nação cujo Deus é o Senhor

“Idolatria é adorar como um Deus algo que não é Deus” - Roger Garaudy



“Acalmar o mercado” era a palavra de ordem do Brasil ao final do governo tucano. Com o dólar já a quase R$ 4,00 e em escalada crescente, a Argentina falida, com sua gente a saquear supermercados e apedrejar bancos, a crise se aproximando mais e mais de nossas fronteiras, via Paraguai e Uruguai (a antiga “Suíça latinoamericana” que, pela primeira vez na história praticou um “Feriado Bancário”), percebendo que o que conduziu a Argentina e o Uruguai à crise foi precisamente o mesmo tipo de orientação econômica praticado no Brasil (paridade da moeda nacional ao dólar, obediência cega aos ditames do FMI, etc...) por ordem da metrópole, ficamos todos evidentemente com as barbas de molho.

O mercado, inquieto, inseguro, nervoso, causa inquietação, insegurança e nervosismo aos seres humanos. Já houve um tempo em que se acreditava que a fúria dos deuses nos trazia tragédias. Hoje em dia este lugar está ocupado pelo mercado. A insegurança do mercado nos traz problemas. Vale tudo para acalmar o mercado: aumentar os juros, aumentar as tarifas de eletricidade e telefone, aumentar os impostos sobre o trabalho, reduzi-lo para produtos importados e suprimi-lo para aplicações financeiras especulativas.

Os viciados em aplicações financeiras deveriam receber tratamento psiquiátrico, serem discriminados em assentos de avião, receber seus documentos com fotos de gente sofrendo de câncer, enfarte, isquemias, tromboses e derrame cerebral, sempre com os avisos clássicos: “lucrar muito com a especulação causa dependência, impotência sexual, derrame cerebral, infarto do miocárdio e outros males mais graves como miséria nacional, dependência do país a interesses estrangeiros, maior valorização da especulação do que da produção nacional e uma grave tendência a eleger gente incompetente e corrupta para altos postos governamentais”.

Lembro-me que durante a crise na Argentina, alguns pessimistas supunham que também o Brasil praticaria “feriados bancários” preventivos para evitar que os correntistas assalariados retirassem seus recursos de contas correntes e poupança numa grave profanação aos templos laicos do Mercado moderno que são as instituições bancárias.

Proteger e acalmar o mercado passa principalmente por proteger e acalmar o grande capital financeiro especulativo que gira nos bancos. Por isso se decretaram feriados bancários na Argentina e no Uruguai. Por isso se temia a decretação de feriados bancários no Brasil. A prioridade número um de qualquer governo capitalista é a de proteger o Capital, o Mercado e os Bancos. Os seres humanos... Bem, se sobrar tempo e a metrópole permitir, pensa-se também nos seres humanos...

Um porta-voz da metrópole disse que via com maus olhos mandar alguma forma de ajuda financeira aqui para a colônia porque os líderes das colônias sofrem de uma forte tendência a privatizar recursos públicos e o enviar a paraísos fiscais...

Houve um esboço de reação, tímido demais para chegar a ser convincente. Países que perderam a soberania nacional têm de escutar mesmo calados esse tipo de coisa. Particularmente quando têm realmente motivos para ficar com a consciência pesada... Há tempos o Brasil imolou sua soberania nacional no altar profano do Mercado sob os auspícios da metrópole norte-americana.

Seria possível resgatar isso, mas a aristocracia nacional aliada à metrópole dedica a maior parte de seu tempo e recursos públicos na busca de maneiras de se perpetuar, seja elegendo gente “de confiança”, seja concedendo autonomia – eufemismo para privatização – a empresas estatais lucrativas ou mesmo todo o sistema financeiro nacional, o controle da moeda, etc.

Outra peculiaridade aqui do Brasil é que as pessoas não participam ativamente da vida política em Ações Diretas, como seria lógico e desejável, limitando-se a escolher no mercado de candidatos aquele que consiga pagar ou cooptar os melhores montadores de imagem. O cidadão, reduzido à condição de eleitor – e eleitor compulsório que se a gente se recusa a participar desta farsa periódica, perde vários direitos de cidadania... – pouco se importa ou mesmo se lembra como é a prática daquele(s) que escolherá para representá-lo. Só a imagem importa e tem gente que é muitíssimo bem remunerada para dourar qualquer pílula de veneno por aqui.

É muito triste que as campanhas políticas eleitorais que decidem o futuro de nossa Nação, de nosso Estado e de nosso Município sejam decididas em fórum tão insignificante e inadequado quanto a mídia. Mais triste ainda ver o grau de importância dado ao mercado. Agora, triste mesmo é saber que nem mesmo isso importa: os principais mandatários do planeta não são sequer escolhidos na farsa eleitoral: são os presidentes do FMI, do Banco Mundial, do Citibank, etc...

O Salmo 32 (33 na Bíblia Protestante), versículo 12 reza: “Feliz a Nação que tem o Senhor por seu Deus.”

O que dizer de uma Nação como o Brasil, que cultua o Mercado como Deus supremo?





Lázaro Curvêlo Chaves - 3 de agosto de 2002

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